Um Novo Ciclo para um Walk&Talk Inspirador
Ainda só começou há uma semana. Termina a 30 de Novembro, na ilha de São Miguel. Mas já se pode dizer que o novo formato do Walk&Talk – de festival para bienal – é o início conseguido de um novo ciclo. Desde 2011 já existiram muitas mudanças, mas as boas práticas e o questionamento, foram uma constante. Agora existe também um aprofundar, sem que vitalidade, exigência e a atitude inquieta se tenham ressentido.
Outros acontecimentos foram surgindo, em Portugal, com motivos algo semelhantes – a ligação com o território, o envolvimento da comunidade, as artes em diálogo permanente, a recriação de espaços não convencionais ou a exploração da ideia de percurso artístico - mas poucos com o mesmo impacto artístico e sociocultural.
Um dos seus maiores triunfos tem sido os alicerces que deixa, a forma como foi ressoando na população local, principalmente entre os mais jovens, conseguindo que as artes passassem a fazer parte de muitas vidas, ao mesmo tempo que ia servindo como casulo de inclusão para muitas outras vozes isoladas ou silenciadas. O espaço permanente da Vaga, uma casa de artes e pensamento, apenas veio reforçar isso.
O Walk&Talk é claramente um trabalho de equipa. Mas é justo destacar Jesse James. Não é apenas alguém com ideias sustentadas, clareza na comunicação, mesmo quando assume incertezas, e capaz de uma escuta ativa, fundamental em processos colaborativos, como é capaz de passar dos conceitos à materialidade com solidez.
Desta vez, na curadoria, para além dele, estiveram Claire Shea, Fatima Bintou Rassoul Sy e Liliana Coutinho, uma verdadeira equipa, e daí resultaram excelentes exposições coletivas ou individuais, momentos performativos (Helle Siljeholm, Ebun Sodipo, Lucy Bleach, Santiago Latorre), excursões que se transformam também em descoberta do território (Vila Verde, Solar de Nossa Senhora do Pilar, Convento dos Franciscanos), concertos ou sessões DJ (Odete, MCfalcona9500) e um sentimento de que a proposta temática geral – “Gestos de Abundância” – encaixou bem no espírito do evento desde o primeiro dia: ser lugar de reflexão e crítica, mas também de construção e ação.
Abundância, não no sentido do excesso material, mas de possibilidades culturais, sociais e espirituais, partilhadas, que se abrem à nossa frente, e que tendemos a não vislumbrar, toldados que estamos perante os inúmeros impasses e obstáculos.
Talvez como única reflexão a fazer – apesar de ela já ter sido feita no passado – é o peso da ilha nas propostas expositivas. Claro que também existem trabalhos que nos transportam para outros lugares. Mas às vezes apetecia que acontecesse mais.
Até 30 de Novembro, há ainda muito para experimentar, ver e fazer. Perdermo-nos, também é uma boa opção. Há sempre lapas para comer e um mergulho a dar.