Baby, o Álbum de Dijon, para Refrescar o Verão

Ainda não tinha saído nenhum daqueles álbuns que são capazes de refrescar o Verão com o balanço certo. E não, não, falo de discotecas em Ibiza cheias de corpos bronzeados com as mãos no ar em grande euforia. Mas daquele tipo de música híbrida (noturna e diurna, analógica e digital, popular e experimental) que ocupa um lugar próprio, mas que ao mesmo tempo convoca uma estranha familiaridade.

A intimidade advém de lhe reconhecermos ascendências (Prince, D’ Angelo, Frank Ocean, Miguel, Plantlife, Spacek, Arthur Russell e outros) e a esquivez de como os elementos são organizados, com uma arquitetura descarnada, crua, fascinante. E não era crível que acontecesse. Nos anteriores EPs e no álbum de estreia, Dijon, prometeu, mas não levantou voo, apesar de ter colaborado, entretanto com Bon Iver ou Justin Bieber, sinal de reconhecimento. O mesmo até com a forma falseteada de cantar.

Parece aquele tipo de cantores que aparece sempre nos concursos de talentos da TV e que tende a chamar a atenção pela forma como improvisa e canta baladas. Depois, na esmagadora maioria dos casos, nunca mais ouvimos falar deles, porque não chega ter voz ou ser intérprete malabarista, para se fazer um artista. “Baby” é outra coisa.

A versatilidade vocal impressiona, mas é o conjunto, a composição, a sonoplastia, os arranjos exploratórios, as letras que escavam em emoções complexas, a sensação de estarmos a ouvir um edifício em construção e a voz – muitas vezes utilizada como mais uma ferramenta – que impressiona. Na feitura de tudo teve ajuda de peso: o talento e guitarra de Mk.gee, uma das revelações do ano passado, outro que consegue aliar identificação (psicadelismo, soul, funk, electro, pop) e singularidade.

 

No caso de Dijon há impulsos rítmicos voluptuosos, digitalismos, espasmos, voz soul, configurações funk ou atmosferas cósmicas, como se tudo se dissolvesse e, ao mesmo tempo, remontasse numa série de idiomas que reconhecemos, mas que nunca ouvíramos inteiramente assim. O Verão, para Dijon, promete tornar-se eterno.

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