O Festival que Mudava Todos os Anos é Agora a Bienal Walk&Talk

Foto: Walk&Talk

Quem tem acompanhado o festival de artes Walk&Talk, que decorre desde 2011, em Ponta Delgada, nos Açores, talvez se reconheça no que vou dizer: é fascinante a forma como, ano a ano, o evento se tem reinventado incessantemente, colocando nos seus gestos desafio e exigência, conseguindo elevar continuamente a fasquia.

Enquanto a maior parte dos festivais utiliza a narrativa da “identidade” como se fosse uma garantia de qualidade, no Walk&Talk a identidade está sempre a ser questionada e refeita, é algo dinâmico e plural. Não surpreende, por isso, a opção de, agora, se transformar numa Bienal, até porque foi criado um espaço permanente de criação em Ponta Delgada (a Vaga), foram superadas etapas de crescimento e urge pensar o presente e futuro com consistência. Para isso é preciso tempo e amadurecimento.

 

De resto, da Bienal, que começa esta quinta, 25 Setembro, e se estende até 30 de Novembro, espera-se o espírito critico de sempre, o convocar de pessoas para a construção e mediação, conciliar novos conceitos e afetos, sempre em conexão com o mundo, sem perder de vista a relação de proximidade com a ilha de São Miguel.

Resultado de um processo curatorial colaborativo, assinado por Claire Shea, Fatima Bintou Rassoul Sy, Jesse James e Liliana Coutinho, a Bienal propõe uma leitura plural do presente, com artes e conhecimento, desafiando a comunidade a participar ativamente na criação do futuro, tendo como mote central: “Gestos de abundância.”

Uma noção instigadora.  Uma mudança de perspetiva. Em vez da escassez, a abundância, não no sentido do excesso, mas como possibilidade de relações e práticas partilhadas. Abundância de possibilidades de organização e de fazer política, muito para lá dos caminhos únicos que nos são impostos, forma de questionar as noções dominantes de consumo, posse e extração, defendendo práticas que regenerem em vez de esgotar, que escutam em vez de impor, que conectam em vez de isolar.

Pensar as relações com o território e os seres, colocando as artes no centro dessa urgência de imaginar futuros possíveis a partir de uma rede de relações, partilhas e interdependências, num momento histórico de tensões, incertezas e desigualdades.

Para já, nos primeiros quatro dias, haverá inaugurações (do Centro de Artes Contemporâneas Arquipélago ao Convento dos Franciscanos), performances (da nova criação da artista e coreógrafa norueguesa Helle Siljeholm, com uma experiência artística subaquática, à abordagem ao erotismo da artista e escritora Ebun Sodipo), conversas, excursões ou visitas orientadas, distribuídas por espaços da ilha, reunindo artistas, curadores, investigadores e público, cruzando arte, paisagem e cidadania.

 

Jantares comunitários, concertos (Velhacos, Odete, MCFalcona9500) ou exposições reunirão, nestes primeiros dias, nomes tão diversos como Inês Coelho da Silva & Kita Rancano, Soya the Cow, Uhura Bqueer, Mirna Bamieh, Alice Visentin, Walla Capelobo, Colectiva Malva, Jane Jin Kaisen, Nadia Belerique, João Pedro Vale, Joana Sá, Jokkoo Collective e muitos outros. Uma abundância de coisas a acontecer, com a curadoria generosa do Walk&Talk, que quer mostrar que é possível, a partir do que existe, pensar em formas de bem-estar para a maioria. É necessário é organizar, cuidar e redistribuir o que temos, de forma diferente daquela que existe neste momento.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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